Doença da língua azul 'ganha terreno' no Alentejo e dizima rebanhos
A febre catarral ovina, conhecida como doença da língua azul, está a ‘ganhar terreno’ no Alentejo e a dizimar rebanhos, já com milhares de animais mortos, provocando prejuízos aos criadores, que se queixam de falta de apoios.
“Eu tenho 20 anos de agricultura e nunca na vida assisti a uma situação destas, nem parecida”, confessa à agência Lusa o presidente da Associação dos Jovens Agricultores do Sul (AJASUL), Diogo Vasconcelos, que também é criador de ovinos.
O novo serotipo 3 do vírus que provoca a doença é transmitido através de insetos, afetando sobretudo os ovinos, e foi detetado, pela primeira vez, em meados de setembro, no distrito de Évora, tendo alastrado, desde então, a todo o Alentejo.
Com a expansão do vírus, os rebanhos estão diariamente a sofrer baixas e o Sistema de Recolha de Cadáveres de Animais Mortos na Exploração (SIRCA), gerido pela associação ACOS - Agricultores do Sul, com sede em Beja, ‘não tem mãos a medir’.
“O nosso pico [de recolha] normalmente é depois de agosto, quando recolhemos cerca de 400 num dia, que é o que tem acontecido em anos anteriores, mas hoje tivemos mais de 2.000 animais para recolher”, exemplifica à Lusa o presidente da ACOS, Rui Garrido.
O dirigente agrícola assinala que este número de cadáveres de animais recolhidos representa “cinco vezes mais do que em igual período do ano passado” e alertou para as proporções que a situação está a ganhar no Alentejo.
No distrito de Évora, onde a AJASUL tem a maioria dos associados, a situação é “desastrosa a todos os níveis”, com “a morte de muitos animais e perdas enormes de produtividade” nas explorações, segundo o presidente desta associação.
Sem dispor de dados oficiais, Diogo Vasconcelos diz que será “difícil de apurar” a dimensão do problema, pois há “agricultores que não declaram [a doença] e os serviços não têm capacidade para analisar”, mas arrisca que “80% a 90% das explorações foram afetadas”.
Com um efetivo de cerca de 650 ovinos, este criador alentejano, em pouco tempo, viu morrerem 30 ovelhas e mais de 100 borregos, que já nasceram mortos ou acabaram por morrer após a nascença, prevendo que ainda morram mais animais.
“As ovelhas [que têm a doença], mesmo parindo, parem borregos prematuros, que não conseguem mamar e não estão desenvolvidos”, pelo que “grande parte deles acaba, infelizmente, por morrer”, salienta.
Criticando o que diz ser “um problema grave de inação por parte do Estado”, pois “a doença já está declarada há muito tempo na Europa”, o presidente da AJASUL lamenta que não tenha sido disponibilizada em tempo útil a vacina que previne a doença.
Também os rebanhos do distrito de Portalegre não escapam à doença e, de acordo com o Agrupamento de Produtores Pecuários do Norte Alentejano - Natur-al-Carnes, estão a surgir diariamente novos casos da doença na região.
Há casas agrícolas que já registaram “uma quantidade enorme de baixas” nos últimos dias, relata à Lusa o presidente do conselho de administração da Natur-al-Carnes, Manuel Goes.
Lembrando que a época do Natal é propícia à venda de borregos, o responsável deste agrupamento de produtores admite que, este ano, o negócio seja prejudicado, devido ao surto de língua azul.
“Podíamos ter uma ajudinha do tempo, se começar a mudar”, já que “o frio vai contra o ciclo do mosquito” mas, para já, o que há a fazer “é desinfetar os rebanhos”, acrescenta.