MP recorre de acórdão que absolveu educadora de maus-tratos em Aveiro
O Ministério Público (MP) recorreu da decisão do Tribunal de Aveiro que absolveu uma antiga educadora de infância de maus-tratos praticados a crianças com idades entre 1 e 3 anos que estavam a seu cargo.
A arguida, de 64 anos, estava acusada de nove crimes de maus-tratos, mas acabou por ser condenada a um ano e quatro meses de prisão suspensa por dois crimes de ofensa à integridade física qualificada.
Não se conformando com esta decisão, a procuradora do MP recorreu para o Tribunal da Relação do Porto (TRP) considerando que foi produzida prova “bastante e segura” que permite a condenação da arguida pela prática de pelo menos quatro crimes de maus-tratos.
No recurso para o TRP, a que a Lusa teve hoje acesso, a procuradora alega que os factos dados como provados "revestem-se de elevada/acentuada gravidade", que "vai muito além dos crimes de ofensa à integridade física simples ou ainda que qualificada", a que a arguida foi condenada.
Relativamente à pena a aplicar, o MP entende que a arguida deve ser condenada a uma pena única de prisão não inferior a quatro anos, cuja execução deverá ser suspensa.
Durante a leitura do acórdão, proferido em outubro, a juíza presidente disse que o tribunal deu como provada apenas a factualidade relacionada com “palmadas que foram desferidas” a duas crianças de 1 ano, em duas ocasiões distintas, durante a sesta e no fraldário.
“Ao atuar dessa forma, o tribunal conclui que ficou demonstrado que se verificou uma ofensa à integridade física nessas crianças”, afirmou a magistrada.
O coletivo de juízes teve em conta que os comportamentos foram praticados em crianças particularmente indefesas.
A favor da arguida, que se encontra reformada, pesou a ausência de antecedentes criminais da arguida e o facto de a mesma ter trabalhado 26 anos no centro social sem qualquer registo ou outra situação idêntica.
O tribunal julgou ainda improcedentes os pedidos de indemnização civil deduzidos pelos pais das crianças.
Os factos ocorreram em 2019 e 2020, quando a arguida trabalhava no Centro Social de Esgueira, tendo a seu cuidado um grupo de crianças com idades entre 1 e 3 anos.
O processo resultou de uma queixa apresentada no Ministério Público (MP) pelos pais das crianças que frequentavam a sala da educadora que, entretanto, foi despedida, após um processo disciplinar.
De acordo com a acusação do MP, a arguida obrigou as crianças que vomitavam no prato a comer a comida onde havia caído o próprio vómito, tendo chegado a amarrar uma criança à cadeira de refeição com panos/lençóis, enquanto esta tomava as refeições.
A arguida terá ainda obrigado as crianças a ingerir alimentos sólidos, tendo, numa das vezes, metido um pedaço de pera na boca de uma menina que se engasgou e deixou de respirar, ficando “estática e com os olhos muito abertos”, tendo sido socorrida por uma das ajudantes que a retirou da cadeira e a colocou no fraldário na posição lateral de segurança.
Segundo o MP, a arguida recusou que a menina fosse observada por um médico e não telefonou à progenitora, nem lhe relatou a situação.
A acusação refere, por outro lado, que a educadora proibiu as ajudantes de dar colo às crianças e, quando estas choravam, “colocava a música do rádio muito alta e cantava em tom alto, tornando o ambiente da sala inadequado para o bem-estar das crianças”.
O MP diz que a arguida molestou repetidamente a “integridade física e o bem-estar psicológico e emocional” destas crianças afetando-as na sua autoestima e desenvolvimento enquanto crianças.