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«Lidar com sofrimento em grande escala faz-nos questionar tudo»

A médica aveirense Mónica Costeira fala sobre as missões humanitárias que a levaram a escrever “Se tu vivesses o que eu vi”

Depois de uma manhã de trabalho no Hospital de Aveiro, Mónica Costeira encontra-se connosco na Baixa de Santo An­tónio. Sentamo-nos num ban­co a salvo das sombras projetadas pelas árvores. «Gos­to de estar ao sol», diz. Esta médica pediatra, de 37 anos, natural de São Jacinto, em Aveiro, lançou recentemente o livro “Se tu vivesses o que eu vi”, em que relata as suas experiências nas missões humanitárias em que participou - na Guiné-Bissau, Grécia, Sudão do Sul, Iemen, Timor Leste e Afeganistão. A realidade que encontrou foi, em muitos casos, «um choque», mas nunca vacilou. «Fugir parecia-me egoísta», diz. Agora, grávida do primeiro filho, ficará por Portugal. Mas, assume, não deve ser mais do que uma pausa.

Diário de Aveiro: Vivemos aqui numa bolha de conforto e segurança, mas o mundo é feio e perigoso, não é?
Mónica Costeira: Sim. Sair de Portugal e da Europa e da realidade que a maior parte de nós conhece é um choque. Mas nem precisamos de sair muito daqui. Uma das experiências que tive foi de voluntariado na Grécia, em campos de refugiados. Pessoas que fogem de conflitos e de cenários grotescos passam por todo um caminho em que são sujeitas a tráfico humano, tortura, trabalho escravo, violência sexual, etc, e depois chegam à Europa e vivem às nossas portas em campos de refugiados sobrelotados e sem condições, com uma casa de banho para 300 pessoas, sem acesso a educação, a saúde… Sem qualquer di­g­nidade… Isso para mim até foi das coisas mais chocantes. No caso de países com um nível sócio-económico menos desenvolvido, é muito duro, porque é o choque do pacote que vem com a pobreza: elevada taxa de mortalidade infantil, elevada taxa de natalidade, tráfico humano, tráfico de órgãos, a discriminação da mulher, o casamento infantil… É uma realidade que é muito difícil de gerir. Muitas vezes são viagens no tempo - 50 ou 100 anos para trás, o que é muito assustador…

Para tempos quase medievais, não?
No Afeganistão, que foi o último local em que estive, existem muitas pessoas que são mortas por se manifestarem contra o regime ou por tentarem fazer coisas contra o que está preconizado. São assassinadas na via pública e expostas, para que as pessoas tenham medo. É um choque mui­to grande e é muito duro presenciar isso.

Que idade tinha quando foi pela primeira vez numa missão fora de Portugal?
Tinha acabado de terminar a faculdade, devia ter uns 25 ou 26.

 

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Dezembro 30, 2024 . 09:00

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