As opções para o futuro energético de Portugal
Este é o famoso trilema que todos os decisores com responsabilidade na política energética, seja a nível dos Governos ou das empresas, se confrontam hoje.
Existem três escolas de pensamento essencialmente: a que os últimos Governos de Portugal têm seguido, inspirada na Energiewende (transição energética) da Alemanha e do Japão depois de Fukushima, e seguida para além de Portugal, pelo Governo do PSOE espanhol, pela Áustria, e pelo Governo da Califórnia, entre outros. Acreditam que é possível atingir, num futuro razoavelmente próximo, um abastecimento à base essencialmente de energias renováveis, desde que a questão do armazenamento seja resolvida à base de baterias e do hidrogénio, esgotado que esteja a bombagem hídrica, ou de qualquer outra tecnologia que surja entretanto. Para isso acontecer, acredita-se numa rápida migração da mobilidade fóssil para a mobilidade elétrica, seja com baterias ou com pilhas de combustível. Esta é a política definida para Portugal, e existe um cuidado óbvio por parte dos principais partidos, seja o do poder, seja o principal da oposição, em manter essa linha de rumo e não a deixar questionar.
A segunda escola, hoje liderada pela França, pela China, Coreia do Sul, Índia, a que se juntou o Japão (que entretanto abandonou a linha anterior), e que incluem a Finlândia, a Suécia, República Checa, Hungria, Eslovénia, Eslováquia, Países Baixos, Polónia, Itália e muitos outros países, entre eles os Estados Unidos, que consideram que só será possível atingir aqueles objetivos usando a energia nuclear para assegurar o diagrama de base do abastecimento elétrico, complementada pelas energias renováveis, que têm verificado uma queda de custos muito significativa na última década. Também considera que só nos poderemos libertar das energias fósseis pela eletrificação da economia, incluindo o setor dos transportes.
A terceira escola de pensamento junta os negacionistas das alterações climáticas e os resignados, liderada pelo dinamarquês Bjorn Lomborg, que, em suma, dizem que não será nem necessário nem possível alterar em tempo útil a matriz energética, que há muitas décadas se mantém praticamente inalterada, com cerca de 80 por cento de consumo satisfeito por energias fósseis, e que considera que o alarme climático é exagerado e não justifica as políticas decididas pelo Tratado de Paris.
Sem dúvida que é a segunda escola de pensamento que está a ganhar força e a impor-se, face à desastrada experiência da política alemã. Infelizmente, a questão politizou-se, sendo que a primeira escola de pensamento aparece conotada com a esquerda, a segunda com o centro-direita e a terceira com a direita mais dura, numa visão simplificada. Mas a consequência é muito relevante. O debate deixou de ser racional e sereno e passou a ser emocional, com radicalização de posições. Existem também enormes interesses económicos em jogo, o que torna o debate ainda mais crispado.
Pessoalmente, não tenho qualquer dúvida que a corrente mais correta técnica e economicamente é a segunda. E pode-se demonstrar com alguma facilidade. As energias renováveis têm duas caraterísticas que não facilita a sua integração nos modernos sistemas energéticos, que necessitam de grandes volumes de energia de forma permanentemente disponível para satisfazer o consumo. Essas caraterísticas são a baixa densidade energética e a sua disponibilidade ao sabor da meteorologia, conhecida como intermitência.
As energias renováveis exigem 200 vezes mais espaço físico do que a energia nuclear para produzirem a mesma quantidade de energia, e exigem entre 14 e 20 vezes mais recursos físicos minerais, dos quais muitos são minerais críticos cuja cadeia de extração e processamento estão hoje totalmente dominados pela China. Significa isto que a pegada ecológica e de sustentabilidade é muito mais favorável para a energia nuclear do que para as energias renováveis, contrariamente à ideia hoje largamente disseminada.
A intermitência, por sua vez, obriga a um aumento exponencial de construção de linhas elétricas e de baterias, que têm o seguinte impacto económico na comparação dos custos totais de integração nas redes num sistema aberto.
Ora, em Portugal, a questão é agravada por uma dificuldade suplementar. O nosso sistema não é aberto, é um sistema estrangulado pelas escassas interligações com os outros sistemas vizinhos, em França e Marrocos, constituindo uma ilha energética. Essa é uma barreira que se vai tornar evidente nos próximos anos e nos obriga a rever, desde, já as opções de política energética, de modo a não sermos surpreendidos por uma situação economicamente insustentável, e sem segurança de abastecimento suficiente para as nossas necessidades, e dependente de forma estrutural, da produção a gás natural, isto é, falhando os três objetivos do trilema energético.
É, pois, absolutamente prioritário iniciar um debate aberto a todas as opções, que nos tire da trajetória atual de seguirmos a toda a velocidade para um beco sem saída, que trará enormes custos para a nossa economia e para a nossa competitividade, e iniciar o debate sobre a viabilidade, vantagens e inconvenientes de se iniciar o uso de energia nuclear na nossa matriz energética.